Diariamente, somos bombardeados por informações vindas de todos os lados. Recebemos notícias, indicadores, análises, e prognósticos que chegam dos cinco continentes. Apesar da enormidade de informações, quase sempre nos vemos incapazes de compreender o que ocorre. Este blog pretende ser uma contribuição para entender esse mundo complexo. É claro, não tem a pretensão de ser um oráculo, que dê conta de tudo o que ocorre no mundo, mas uma busca incessante de entender o que acontece à nossa volta.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

O que é a Questão Palestina?

3ª parte: Dos Acordos de Oslo ao impasse atual (1993-2012)
Atualizado em 1° de dezembro de 2012


Como vimos anteriormente, muita esperança foi depositada nos Acordos de Oslo. A "declaração de princípios", embora criticada por muitos palestinos, parecia oferecer uma solução definitiva para um conflito quase secular.  Se houvesse uma continuação sólida na implantação do que era previsto nos acordos, por volta da virada do século os palestinos poderiam ter um Estado.
Com os acordos, foi criada a Autoridade Nacional Palestina (ANP), um órgão quase governamental, encarregado de ser a instituição estatal prévia à criação de um Estado Palestino. Yasser Arafat foi o primeiro presidente da ANP. E nas eleições de 1996, foi confirmado no cargo.
Havia uma sensação de que o conflito terminaria, tanto que o termo usado nas negociações era "processo de paz", como se todo o caminho já estivesse dado.O grau de otimismo era enorme e Yasser Arafat, Ytzak Rabin e Shimon Peres (Presidente de Israel) receberam o Prêmio Nobel da Paz em 1994.
Contudo, além de gestos e fotografias, era necessário um envolvimento político de fato do governo de Israel em levar adiante o que havia sido acordado com Arafat. Rabin parecia estar de fato comprometido com a conclusão do acordo. Porém, nem toda a sociedade israelense estava disposta a isso. Em 4 de novembro de 1995, Rabin foi assassinado por um extremista religioso judeu, contrário à retirada de Israel da Cisjordânia e da Faixa de Gaza.
Os grupos extremistas judeus entendem que toda a Palestina deve ficar sob controle israelense. Há, pelo menos, três segmentos que defendem a não retirada dos territórios ocupados, por razões diferentes: os religiosos, que alegam que toda a Palestina foi dada aos judeus pelo próprio Deus (Yahweh, YHWH) ; os nacionalistas, que entendem que toda a Palestina que estava sob Mandato Britânico é território inviolável do povo judeu; e os militaristas, que dizem que, com uma Cisjordânia independente, o Estado de Israel estaria vulnerável a um ataque árabe vindo do Leste.
Tais grupos foram ajudados durante décadas por políticas oficiais. Desde que a Cisjordânia foi ocupada em 1967, iniciou-se a construção de colônias judaicas nesse território. Facilidades de assentamento, redução de impostos e outros incentivos governamentais fizeram crescer enormemente a população judaica na Cisjordânia, chamada por muitos desses grupos pelos nomes bíblicos de Judeia e Samaria. Além disso, sucessivos governos israelenses realizaram investidas populacionais em Jerusalém Oriental (reconhecida por muitos países como capital do futuro Estado palestino), visando tornar essa parte da cidade menos "arabizada". Para alguns grupos israelenses, Jerusalém é a "capital eterna e indivisível de Israel" e seria uma espécie de traição dividir a cidade com os palestinos. Colônias também foram construídas na Faixa de Gaza, mas o governo de Israel desmantelou todos os assentamentos judaicos na área em 2005.
Após os Acordos de Oslo, os grupos extremistas judeus iniciaram também uma série de ataques à população palestina. O pior deles ocorreu em 1994, quando um extremista judeu assassinou 29 muçulmanos que oravam na Tumba dos Patriarcas, em Hebron, onde muçulmanos, cristãos e judeus acreditam que o profeta Abraão está sepultado.
Paralelamente a isso, os palestinos também atacavam israelenses. Nesse período, entrou em cena de forma mais contundente o Hamas (Movimento de Resistência Islâmica). O Hamas foi criado durante a Primeira Intifada. Manifestamente religioso, pregava a destruição de Israel e a construção de uma Palestina muçulmana. Era, além disso, frontalmente oposto ao Fatah, que liderava a OLP. Por isso, de todos os grupos que surgiram em meio à Intifada, apenas o Hamas não se juntou à OLP. O curioso é que o Hamas deve muito de sua existência a Israel. O governo israelense, durante a década de 1980, em uma tentativa de enfraquecer a OLP, concedeu vultosos montantes ao grupo assistencialista muçulmano chamado Al-Mujamah (O Congresso), liderado pelo Sheik Ahmed Yassin, mesmo tendo encontrado, em 1984, um grande arsenal em uma mesquita administrada pelo grupo. Em 1987, Yassin e outros membros da al-Mujamah fundaram o Hamas.
Diante da escalada da violência palestina, as eleições israelenses de 1996 levaram ao poder o líder nacionalista Benjamin Netanyahu, do partido Likud (um partido de direita). Como Primeiro-Ministro, Netanyahu adotou certos procedimentos seguindo o processo de paz com os palestinos, como a retirada de Israel de algumas partes de Hebron e as tentativas de diálogo com Yasser Arafat. Contudo, em outras partes, desconsiderou os Acordos de Oslo e adotou medidas governamentais que elevaram o número de assentamentos judaicos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
Diante dessa política, a relação entre palestinos e israelenses se deteriorou cada vez mais. Da mesma forma, Netanyahu perdeu apoio interno. Foi acusado pela direita de fazer demasiadas concessões aos palestinos e criticado duramente pela esquerda por continuar a colonização da Cisjordânia. Com o aumento de seu isolamento político, foi derrotado nas eleições de 1999 por Ehud Barak do Partido Trabalhista (esquerda).
Barak buscou, com a intermediação de Estados Unidos e Liga Árabe, um acordo com os palestinos. Os palestinos lutavam por um Estado na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, tendo Jerusalém Oriental como capital. Em 2000 israelenses e palestinos tentaram chegar a um acordo na Conferência de Camp David. Há muita controvérsia e especulação sobre esse encontro, já que não houve nenhum documento escrito. Para muitos israelenses, Barak ofereceu o que os palestinos queriam, cedendo inclusive na questão de Jerusalém. A culpa pela falta de acordo seria de Arafat, ao não aceitar a ótima oferta. Para os palestinos, Barak não ofereceu tudo, quis deixar a questão de Jerusalém para ser resolvida posteriormente e propôs a manutenção de uma faixa de terra ao longo do rio Jordão em poder de Israel, como tampão contra uma eventual invasão árabe. É difícil saber exatamente o que ocorreu. Acusações são trocadas pelos dois lados desde então. O fato é que o acordo não foi alcançado.
Mas em 2000, outro evento sacudiu a relação entre palestinos e israelenses. Em 28 de setembro, Ariel Sharon fez uma visita à Esplanada das Mesquitas em Jerusalém, o que foi visto por muitos palestinos como um ato de provocação. A violência explodiu no que ficou conhecido como Segunda Intifada, ou Intifada de Al-Aqsa (referência a uma das mesquitas localizada na esplanada).
Porém, uma diferença significativa marcou esse levante em relação à primeira Intifada. Não eram somente paus e pedras a serem utilizados pelos palestinos, mas ataques terroristas contra civis israelenses. Vários ataques se sucederam entre 2000 e 2001, com destaque para a utilização de ataques suicidas.
Em 2001, diante da escalada da violência, os israelenses elegeram o linha-dura Ariel Sharon como primeiro ministro. Afirmando se comprometer com o processo de paz, Sharon tentou negociar com Arafat, ao mesmo tempo em que tomou duras medidas para deter os atentados terroristas. Porém, a relação foi rompida de vez em 2002, quando Sharon invadiu as áreas autônomas da Cisjordânia (áreas com controle palestino segundo os Acordos de Oslo) com tanques e artilharia pesada e isolou Arafat no quarte-general da ANP em Ramalah.
Após muitas críticas internacionais, especialmente da Europa, e acusações de violações dos direitos humanos por parte de militares israelenses na cidade palestina de Jenin, as forças armadas de Israel se retiraram do território. Porém, os ataques continuaram. Os anos de 2001 e 2002 foram os mais sangrentos da Segunda Intifada, mas os ataques continuaram em 2003 e 2004.
Em 2004, Yasser Arafat faleceu, sendo substituído por um de seus mais próximos aliados, Mahmoud Abbas. Foi forte a comoção na Palestina. Milhares de pessoas compareceram aos funerais do líder que conduzia a causa palestina desde a década de 1960. Abbas, embora comprometido com o processo de paz, não consegue, desde então, fazer com que Israel ceda nas negociações. Sua fraqueza externa é ainda mais agravada pela fraqueza interna. Em 2006, ocorreu um evento significativo na política palestina. Nas eleições parlamentares, o Hamas venceu o Fatah, tendo o direito de indicar o Primeiro-Ministro da ANP, a primeira vez desde 1969 que o Fatah perdia a primazia no movimento político palestino.
Externamente, a vitória do Hamas foi um choque. Considerado terrorista pelos Estados Unidos, pela União Europeia e por Israel, o Hamas agora ocupava um cargo político, tendo sido eleito democraticamente. Os Estados Unidos foram pegos de surpresa e ficaram em uma situação complicada, já que o presidente George W. Bush havia invadido o Iraque em 2003 afirmando querer levar democracia aos iraquianos e agora se viu na posição de não aceitar o resultado de eleições que haviam sido fiscalizadas por observadores internacionais. O governo norte-americano passou a ameaçar o corte de financiamento à ANP caso o Hamas não renunciasse ao terrorismo.
No plano interno, Hamas e Fatah chegaram a administrar os territórios palestinos autônomos por meio de um governo de união. Administravam conjuntamente a Faixa de Gaza, que foi desocupada por Israel em 2005, e algumas cidades da Cisjordânia, autônomas segundo os Acordos de Oslo. Porém, em 2007, os dois partidos entraram em confronto armado na Faixa de Gaza e o Hamas expulsou o Fatah do território. Na prática, atualmente a Faixa de Gaza é governada pelo Hamas e as áreas autônomas da Cisjordânia, pelo Fatah. Nos últimos anos, há uma tentativa de reconciliação, que ainda não surtiu efeito.
Paralelamente a essa contenda interna, a violência contra Israel continuou nos primeiros anos do século XXI. Como as medidas de restrição de movimento aos palestinos, como a passagem por postos de checagem militares (check points), não davam resultado, o governo de Israel iniciou a construção de uma barreira física denominada pelos israelenses como "Cerca de Defesa", um muro que isola a Cisjordânia de Israel e de assentamentos judaicos construídos dentro da Cisjordânia. Grupos da comunidade internacional condenam a construção do muro porque avança no interior do território considerado palestino e cria um fato consumado nas colônias protegidas pela barreira. Ativistas israelenses, palestinos e de outros países chamam a barreira de "Muro do Apartheid". A despeito das críticas, a construção da barreira - que, na verdade, começou em 2000 - foi acelerada após a eclosão da Segunda Intifada. De acordo com autoridades israelenses, o número de atentados palestinos diminuiu consideravelmente após a construção da cerca.


Porém, como a solução política não foi alcançada, extremistas palestinos continuam usando a violência contra Israel. Porém, agora por meio do lançamento de foguetes rudimentares da Faixa de Gaza para o Sul de Israel. Os foguetes causam pouco ou nenhum dano militar a Israel. Contudo, o efeito psicológico é devastador. Israelenses que moram em cidades como Sderot e Ashkelon vivem em permanente estado de tensão, temendo ser atingidos por foguetes disparados pelo braço armado do Hamas e por outros grupos, como as Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa, a Jihad Islâmica da Palestina e os Comitês de Resistência Popular. Em geral, Israel ataca pontualmente locais que, segundo órgãos de inteligência, armazenam tais foguetes ou faz operações contra grupos que se direcionam à fronteira da Faixa de Gaza para cometerem os ataques. Porém, entre dezembro de 2008 e janeiro de 2009, as forças armadas israelenses se engajaram em uma campanha avassaladora, que também tinha o objetivo de resgatar o soldado israelense Gilad Shalit, sequestrado pelo Hamas em junho de 2006. A operação denominada "Chumbo Fundido" resultou na morte de cerca de 1.400 palestinos, muitos dos quais eram civis, incluindo mulheres e crianças. As imagens correram o mundo e as críticas contra Israel foram imensas. Houve um relatório da ONU condenando Israel por uso desproporcional da força e por usar mísseis de fósforo branco, proibidos por convenções internacionais.
No plano político israelense, também ocorreram mudanças importantes. Quando Ariel Sharon decidiu desmantelar as colônias judaicas na Faixa de Gaza, em 2005, no que ficou conhecido como "desengajamento", a reação no interior de seu partido, Likud, foi enorme. Sharon então se desfiliou e fundou o Kadima. Porém, em dezembro de 2005, sofreu um ataque cardíaco e se mantém até hoje em estado de coma. Como substituto, assumiu como Primeiro-Ministro Ehud Olmert, que posteriormente foi eleito para o termo 2006-2009. Em 2006 Olmert ordenou o ataque israelense ao Líbano, com o objetivo de destruir o grupo libanês muçulmano xiita Hizbollah, que atacava o norte de Israel. Olmert fracassou e o grupo xiita saiu fortalecido politicamente do conflito. Além disso, os ataques da Faixa de Gaza continuavam. Foi Olmert quem ordenou a operação Chumbo Fundido. Fracassou também em sua tentativa de destruir o Hamas. Diante disso, perdeu as eleições de 2009 para Benjamin Netanyahu, que desde então ocupa, pela segunda vez, o cargo de Primeiro-Ministro.
O momento atual é de impasse. O Likud, partido de Netanyahu, conseguiu formar um governo formando uma coalizão com grupos extremistas religiosos. Assim, qualquer acordo com os palestinos parece muito distante. Em 2011, os palestinos foram à ONU em busca de uma resolução reconhecendo o Estado palestino. Certamente, uma resolução favorável seria aprovada na Assembleia Geral. Porém, ainda mais certo seria o veto dos Estados Unidos no Conselho de Segurança. Assim, o caso continua na ONU aguardando mais desdobramentos.
Enquanto isso, Israel continua a construir assentamentos na Cisjordânia e continua a povoar Jerusalém Oriental com cidadãos israelenses, às vezes por meio da expulsão (com ou sem instrumentos jurídicos) de famílias palestinas que habitam a cidade há gerações. A Cisjordânia sob controle palestino não passa de um aglomerado de territórios desconexos, descontínuos, cujos moradores não têm liberdade de movimento, como mostra o mapa abaixo (as partes em marrom são as regiões A, sob total administração palestina, civil e militar; as partes em laranja, são os territórios B, administração civil palestina e militar israelense; e as partes azuis são as áreas C, sob total controle israelense - tal divisão foi elaborada nos Acordos de Oslo).


Internacionalmente, a solução mais defendida é a criação de dois Estados. Porém, com o ritmo elevado de construção de assentamentos judaicos na Cisjordânia, essa solução, para muitos, parece cada vez mais inviável. Por isso, em 29 de novembro de 2012, Mahmoud Abbas recorreu à Assembleia Geral da ONU para salvar a solução de dois Estados. A aprovação da resolução A/67/L.28, elevando o status da Palestina a "Estado Observador Não-Membro" na ONU, por uma esmagadora maioria de 138 a 9, foi um evento significativo e garantiu legitimidade ao Estado palestino. Contudo, os resultados ainda são incertos.
Alguns defendem a criação de um Estado único para palestinos e israelenses. Se isso ocorrer, Israel estará em uma encruzilhada. Se incluir todos os palestinos politicamente e civilmente no Estado, isso fará com que Israel deixe de ser um Estado judeu. Se não fizer isso, será um Estado similar à África do Sul do Apartheid. Assim, os israelenses hoje estão diante de três opções: 1) Um Estado judeu em parte da Palestina; 2) Um Estado bi-nacional em toda a Palestina; ou 3) Um Estado judeu em toda a Palestina mantido por um sistema de segregação.
O futuro nos dirá o fim da História.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

A internacionalização dos confrontos na Síria

Atualizado em 6 de junho de 2013

Assim como ocorreu no Líbano entre as décadas de 1950 e 1990, a Síria hoje vive em uma guerra civil em que se confrontam não apenas os grupos internos, mas também as tendências políticas regionais. A Crise na Síria foi internacionalizada e o território sírio tornou-se, assim, um campo de batalha regional.
Após alguns casos militares emblemáticos, como a derrubada de uma aeronave do governo, fica claro para diversos analistas que o chamado "Exército Livre da Síria" (ELS) está sendo armado por atores externos. Isso requer uma análise um pouco mais aprofundada sobre a política regional do Oriente Médio e os desequilíbrios causados pela "Primavera Árabe".



O Oriente Médio da primeira década do século XXI continha, de maneira geral, um arranjo geopolítico delineado. De um lado, havia os atores pró-Ocidente: Israel, Arábia Saudita, Egito, Turquia, Jordânia, Estados do Golfo, Iraque (pós-invasão americana), Kuwait, o Fatah palestino e alguns grupos libaneses - aliados dos Estados Unidos e da União Europeia; de outro, os atores anti-Ocidente: Irã, Síria, Hizbollah libanês e o Hamas, na Palestina - atores, em um nível político global, próximos à Rússia e à China.
Após as revoltas que derrubaram governos e os casos em que o destino político ainda está em aberto (como a Síria, Bahrein e Egito), a divisão geopolítica tornou-se mais confusa. O Egito ainda não se definiu claramente sobre Israel e Estados Unidos. A oposição na Síria é fragmentada e diversificada e nada garante que um governo pós-Asad será orientado para o Ocidente. O Hamas retirou seu apoio ao governo Asad e se aproximou do Catar, um ator com grande grau de autonomia diplomática.
No nível global, ainda que os Estados Unidos não esperassem o levante popular na Síria, por conta de sua posição internacional tiveram que pressionar Bashar al-Asad a pôr fim ao massacre de civis. Como isso não ocorreu, norte-americanos e europeus iniciaram uma onda de sanções econômicas com vistas a debilitar o governo e a impedir a aquisição de armas pesadas. Porém, a Rússia continua vendendo armas para o regime de Bashar al-Asad, enquanto o Irã continua e conceder importantes empréstimos para o governo sírio.
Para contrabalançar o poderio militar governamental, países como Arábia Saudita e Catar começaram a armar o ELS. Armas pesadas, inclusive com baterias anti-aéreas foram fornecidas para a oposição, o que possibilitou que o ELS avançasse sobre Alepo e Damasco, as duas cidades mais importantes do país e com maior poderio militar do governo. A Rússia anunciou em maio de 2013 que forneceria baterias anti-aéreas para a Síria, impossibilitando a eventual criação de uma zona de exclusão aérea, como ocorreu na Líbia. Os Estados Unidos declararam que ajudam a oposição, porém, não com armas. Segundo o Departamento de Estado americano, Washington tem fornecido equipamentos de comunicação. Nos últimos meses, tem se intensificado a tendência dos Estados Unidos de passarem a fornecer armamentos aos rebeldes. Por outro lado, há fortes indícios de que militantes extremistas saídos do Iraque e do Afeganistão tenham se infiltrado na Síria.Tudo isso possibilitou também que o ELS ocupasse e controlasse efetivamente nacos de território sírio. Tal configuração de poder foi tomada como critério por analistas militares para configurar a crise na Síria como "guerra civil" e não mais como um levante.



Diversos atores participam da guerra civil na Síria porque muito está em jogo nesse conflito. Para o Irã, significa a perda de seu mais importante aliado no Oriente Médio e que um governo pró-Ocidente poderia emergir na sua fronteira, o que poderia ajudar Estados Unidos e Israel. Porém, Israel também está apreensivo com os possíveis resultados do conflito. Ainda que se declarasse manifestamente inimigo de Israel, Bahsar al-Asad nunca tomou ações substanciais para retomar as Colinas de Golã, território ocupado por Israel na Guerra dos Seis Dias, em junho de 1967. Um governo hostil, de tendência islamista ou outra, poderia desequilibrar a situação militar na fronteira e levar a uma nova guerra entre Israel e Síria. Além disso, israelenses temem que o grande arsenal de armas químicas sírias caia em mãos de terroristas que desejam atacar Israel. O Hizbollah teme, com a queda de Asad, a perda de uma fonte de apoio militar e político. Em maio e junho de 2013, o grupo xiita libanês participou ativamente dos combates na estratégica cidade de al-Qusayr. Já a Rússia teme perder sua última base militar no Mediterrâneo, na cidade de Latakia.
Se há quem perca ou tema a queda de Asad, há outros atores regionais que esperam ansiosamente por uma mudança de regime na Síria. Arábia Saudita, Jordânia e Catar são países adversários de Asad, que ganhariam uma nova influência regional se houvesse um enfraquecimento do poderio político e militar da Síria e de seu aliado Irã.
Por tudo isso, a guerra civil na Síria se complexifica e se torna mais sangrenta com o grande afluxo de armas. Governo e oposição são acusados de violações de direitos humanos. E a perda de vidas se torna mais elevada. O resultado da guerra civil na Síria ainda não pode ser afirmado com certeza. Porém, o que se sabe é que a política regional não será a mesma depois do desfecho do sangrento confronto sírio.