Atualizado em 21 de janeiro de 2013, 10:20h (Brasília)
Na manhã do dia 16 de janeiro, grupos extremistas islâmicos invadiram uma usina de extração de gás natural na localidade de In Amenas, no Leste da Argélia, tomando centenas de trabalhadores como reféns. O governo argelino ordenou uma ação militar para retomar a usina, que causou a morte de sequestradores e reféns. A situação tornou-se bastante difícil e temia-se um desfecho trágico.
Mas, exatamente, o que está acontecendo na Argélia?
Na manhã do dia 16 de janeiro, grupos extremistas islâmicos invadiram uma usina de extração de gás natural na localidade de In Amenas, no Leste da Argélia, tomando centenas de trabalhadores como reféns. O governo argelino ordenou uma ação militar para retomar a usina, que causou a morte de sequestradores e reféns. A situação tornou-se bastante difícil e temia-se um desfecho trágico.
Mas, exatamente, o que está acontecendo na Argélia?
Na verdade, inicialmente, foi extremamente difícil saber com precisão o que ocorria no interior do complexo. As informações eram desencontradas e as notícias contraditórias.
Após dias de informações desencontradas na imprensa internacional, foram apontados dois grupos, ambos manifestando ligação com a rede terrorista Al-Qaeda, como prováveis responsáveis.
Após dias de informações desencontradas na imprensa internacional, foram apontados dois grupos, ambos manifestando ligação com a rede terrorista Al-Qaeda, como prováveis responsáveis.
As primeiras informações apontavam para o grupo que se denomina "Al-Qaeda no Maghreb Islâmico" (AQMI). Segundo as primeiras notícias, o grupo havia assumido o ataque e declarado que sua ação foi uma retaliação à ação francesa no Mali (Ver O que está acontecendo no Mali?).
Posteriormente, outro grupo foi apontado como responsável: os "Batalhões que Assinam com Sangue", grupo liderado por Mokhtar Belmokhtar, um extremista que lutou contra os soviéticos no Afeganistão na década de 1980. Também chamado de "Mestre de um olho só" (por ter perdido um olho em uma de suas várias batalhas) ou "Senhor Marlboro" (por ser um dos grandes chefes do tráfico de cigarros pelo Deserto do Saara), Belmokhtar já havia realizado sequestros de estrangeiros anteriormente. Após passar vários anos no exterior, retornou à Argélia em 1992. Foi um dos líderes do AQMI nos últimos anos, mas rompeu com esse grupo em 2012 por divergências referentes às operações no Mali. Apesar disso, afirma que se mantém seguidor do ideário da Al-Qaeda.
Agora, após o desfecho do episódio, foi confirmado que foi essa organização a responsável pela invasão, após Belmokhtar divulgar uma declaração afirmando a autoria.
Agora, após o desfecho do episódio, foi confirmado que foi essa organização a responsável pela invasão, após Belmokhtar divulgar uma declaração afirmando a autoria.
A invasão em In Amenas é mais um episódio da escalada de violência no Norte da África, que há anos vem sofrendo com a ação de extremistas islâmicos.
Muitos analistas apontaram inicialmente para o AQMI porque este é o principal grupo islamista em atuação na região. O grupo possui grande poder de fogo; estima-se que seus seguidores estejam entre 600 e 800 homens, dispersos pela região do Sahel e do Saara; e o grupo tem conseguido realizar ataques sem que forças governamentais o contenham. Na verdade, o grupo tem se beneficiado da fraca presença do Estado na região. Por conta disso, o grupo conseguiu fontes de financiamento por meio de sequestros de estrangeiros, contrabando de cigarros e de narcóticos. Além disso, integrantes do AQMI adquiram armas na Líbia durante a guerra civil para a derrubada de Muammar al-Qadafi.
A proliferação de agrupamentos extremistas islâmicos na Argélia remonta à guerra civil na década de 1990, quando grupos islamistas adotaram a luta armada contra o governo secular argelino.
Os problemas começaram quando o governo cancelou o segundo turno das eleições parlamentares de 1992, em que uma vitória da coalizão de partidos islamistas do país era dada como certa.
Dessa forma, os grupos islamistas, que até então buscavam se integrar ao processo político, se radicalizaram e adotaram a ação armada contra o governo. O primeiro grupo extremista surgido nesse contexto foi o "Grupo Armado Islâmico" (GAI). Os militantes do GAI eram conhecidos por seus métodos extremamente violentos, atacando alvos governamentais e civis. Devido à brutalidade de suas ações, gradativamente perdeu legitimidade. Em 1998, um grupo de militantes rompeu com a liderança do GAI e formou o "Grupo Salafista para a Pregação e o Combate" (GSPC).
Rapidamente, o GSPC tornou-se bastante popular, ao se apresentar como uma fonte de oposição eficaz ao governo (que, por sua vez, usava métodos violentos contra os opositores), ao mesmo tempo em que não cometia ataques indiscriminados contra civis.
Porém, em 1999, o governo concedeu anistia a esse grupo e a outros grupos islamistas menores. A intensidade da luta arrefeceu, bem como os números de militantes do GSPC.
O GAI (grupo de onde saiu o GSPC) se recusou a aceitar a anistia e continuou sua luta contra o governo, declarando que seu objetivo era a construção de um estado islâmico na Argélia.
Paralelamente a isso, alguns integrantes do GSPC não aceitaram a anistia. E em 2000 os líderes do grupo declararam que haviam se juntado à Al-Qaeda. Porém, somente em 2006, o então segundo homem da Al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, reconheceu a organização como parte da jihad no Norte da África.
Em 2007, os líderes do GSPC declararam que o novo nome do grupo era "Al-Qaeda no Maghreb Islâmico". Desde então, o grupo tem estendido seu campo de atuação para outros países da região, adotando uma estratégia e uma filosofia caras à Al-Qaeda, isto é, uma luta que cruza as fronteiras dos estados estabelecidos. A partir desse momento, integrantes do AQMI passaram a atuar em outros países da região do Saara e do Sahel, como Mali, Marrocos, Níger, Tunísia, Chade e Mauritânia. Há indícios, inclusive, de sua participação no ataque à Embaixada norte-americana em Benghazi, na Líbia. Além disso, não só os ataques se internacionalizaram, mas também a militância tornou-se internacionalizada, outra característica da Al-Qaeda. Atualmente, entre os integrantes do AQMI, além de argelinos, há combatentes saídos do Mali, Tunísia e Líbia.
Há temores de países europeus que células do AQMI possam cometer ataques na Europa. Em 2007, policiais franceses descobriram uma célula do grupo em Paris e, em 2008, autoridades espanholas prenderam oito homens com ligações com o AQMI.
Por fim, com a ascensão dos "Batalhões que Assinam com Sangue", fruto do racha no AQMI, emerge mais um grupo extremista na região, o que complexifica ainda mais a situação.
O fraco poder militar dos Estados da região, a porosidade das fronteiras, a proliferação de armas decorrente dos conflitos na Líbia e no Mali e as características naturais da região facilitam significativamente o aumento do poder dos grupos extremistas no Norte da África.
A invasão ao complexo de extração de gás natural de In Amenas tem implicações mais amplas que a política regional. A usina é operada por uma associação entre as empresas British Petroleum (Grã-Bretanha), Statoil (Noruega) e Sonatrach (Argélia). Além disso, trabalham na empresa, centenas de empregados estrangeiros - noruegueses, britânicos, japoneses, norte-americanos, franceses etc. Muitos deles estavam entre os reféns e alguns foram mortos.
Desfecho
Por volta das 14h do dia 19 de janeiro, no horário de Brasília, foi anunciado que uma operação militar argelina empreendeu um "ataque final" e conseguiu pôr fim à crise. Como resultado da operação, 16 reféns foram libertados e 7 reféns e 11 sequestradores foram mortos.
O total de mortos em todo o episódio ainda não foi esclarecido. Os últimos números fornecidos pelas autoridades argelinas apontam para 81 mortos. Porém, esta ainda não é a contagem oficial.
Segundo números fornecidos por militares, foram libertados 685 reféns argelinos e 107 estrangeiros ao longo dos quatro dias de operações.
A despeito da (custosa) vitória do governo de Argel sobre os militantes extremistas, a região continua sob ameaça de novos ataques.
Vocabulário:
Maghreb - palavra árabe que significa "Ocidente". Define-se hoje como o Noroeste da África - região que engloba Argélia, Tunísia, Marrocos. Alguns incluem a Líbia.
Sahel - Região semi-árida que faz transição entre o Deserto do Saara, ao Norte, e as florestas úmidas ao Sul. Faixa que se estende da costa atlântica ao leste do continente , cobrindo os territórios da Mauritânia, Níger, Mali, Burkina Faso, Nigéria, Chade e Sudão.
O total de mortos em todo o episódio ainda não foi esclarecido. Os últimos números fornecidos pelas autoridades argelinas apontam para 81 mortos. Porém, esta ainda não é a contagem oficial.
Segundo números fornecidos por militares, foram libertados 685 reféns argelinos e 107 estrangeiros ao longo dos quatro dias de operações.
A despeito da (custosa) vitória do governo de Argel sobre os militantes extremistas, a região continua sob ameaça de novos ataques.
Vocabulário:
Maghreb - palavra árabe que significa "Ocidente". Define-se hoje como o Noroeste da África - região que engloba Argélia, Tunísia, Marrocos. Alguns incluem a Líbia.
Sahel - Região semi-árida que faz transição entre o Deserto do Saara, ao Norte, e as florestas úmidas ao Sul. Faixa que se estende da costa atlântica ao leste do continente , cobrindo os territórios da Mauritânia, Níger, Mali, Burkina Faso, Nigéria, Chade e Sudão.