Atualizada em 11 de junho de 2012
Eleições parlamentares em Mianmar,
antiga Birmânia, possibilitaram que,
pela primeira vez em 20 anos, um político de
oposição assumisse um cargo legislativo no país,
quando Aung San Suu Kyi foi eleita. Suu Kyi é a mais importante personalidade
do país a lutar por reformas democráticas.
Porém,
apesar da vitória eleitoral, os desafios
continuam imensos. O país vive sob um regime militar desde 1962 e desde 1988
Mianmar está sob efetivo controle de uma junta militar,
embora o país possua nominalmente um governo civil. Suu Kyi chegou a ameaçar não tomar posse caso a Constituição aprovada em 2008 não fosse revogada. A
situação ainda permanece nebulosa e o mundo ainda observa os rumos políticos do
país do Sudeste Asiático. Mas, afinal,
o que acontece em Mianmar?
Para podemos compreender esse
presente conturbado, é interessante observar a
história do país.
O país hoje denominado Mianmar
também é conhecido como Birmânia ou Burma e tem uma longa história. A primeira
vez que a região foi unida se deu em 1044 D.C.,
quando uma dinastia conseguiu unir todas as etnias em um único reino e
possibilitou uma grande efervescência cultural. Esse foi o período da entrada
do Budismo na Birmânia e da construção dos monumentos budistas que até hoje
atraem milhares de turistas anualmente ao país.
Após séculos de sucessivas alterações
nas condições políticas – reino independente,
parte do Império Mongol, lutas internas,
mudanças dinásticas – a Birmânia caiu sob controle da Grã-Bretanha em 1885. Os
britânicos começaram sua conquista em 1824 e após três guerras,
conquistaram definitivamente o local e o anexaram à Índia Britânica.
Durante a Segunda Grande Guerra,
um grupo de birmaneses, conhecidos como os “30
camaradas”, se juntou aos japoneses contra os
britânicos. Porém, com o decorrer da guerra,
mudaram de lado e apoiaram os Estados Unidos e a Grã-Bretanha.
Após a derrota do Japão,
o General Aung Sun liderou um movimento que demandava a independência da
Birmânia. Sem condições de manterem seu império na Ásia,
os britânicos cederam. A Constituição da Birmânia foi elaborada e o país se
tornou independente em 1948. Porém, Aung Sun e
a maioria de seus apoiadores foram assassinados antes da Constituição entrar em
vigor.
Entre 1948 e 1962,
o país conheceu um governo democrático,
parlamentar. Porém, as lutas políticas e
étnicas internas eram ferozes, o que levou ao
golpe militar em 1962, liderado pelo General
Ne Win. Logo após a tomada do poder, o novo
governo iniciou um projeto de construção de um regime de inspiração socialista na
Birmânia.
Em 1988,
a deterioração da situação econômica do país levou a imensas manifestações
exigindo mudanças políticas. Milhares de estudantes,
trabalhadores e monges budistas tomaram as ruas exigindo reformas democráticas.
A resposta foi uma violenta repressão aos manifestantes. Diante da
instabilidade, um grupo de generais depôs Ne
Win, suspendeu a constituição,
desmontou o sistema socialista construído pelo regime antecessor e mudou o nome
do país para União de Mianmar. O novo governo foi violento na repressão das
manifestações. Estatísticas indicam que cerca de 3.000 pessoas foram mortas
pelas forças militares.
Entre 1988 e 2011,
uma junta militar governou o país, embora ocorressem eleições regularmente. Em 2008 foi aprovada a Constituição ainda em vigor no país, que concede amplos poderes aos militares. Prevê que seja reservado um quarto dos assentos do parlamento aos militares e que três ministérios chave – Interior, Defesa e Assuntos de Fronteiras – sejam ocupados por Generais da ativa.
Dentre os opositores do regime
instalado em 1988, destacou-se a ativista Aung
San Suu Kyi.
Suu Kyi,
filha do General e herói da independência Aung Sun,
nasceu em 1945. Após morar um tempo com a mãe na Índia,
se mudou para a Inglaterra. Estudou filosofia,
economia e ciência política na Universidade de Oxford. Suu Kyi residiu na
Inglaterra até 1988, quando retornou à sua
terra natal.
Suu Kyi retornou à Birmânia em
meio às turbulências políticas de 1988 e se juntou aos protestos contra
o Presidente Ne Win e liderou comícios por todo o país,
inspirada pelas táticas de Martin Luther King e Mahatma Ghandi. Quando a junta
militar derrubou Ne Win, Suu Kyi se manteve na
vanguarda da luta por reformas democráticas. Como resultado, foi posta em prisão domiciliar em 1989.
Em 1990,
o governo militar convocou eleições. Esperando uma esmagadora vitória,
os novos governantes não adotaram medidas para tentar controlar o resultado das
eleições. Com isso, o partido liderado por Suu
Kyi, a Liga Nacional pela Democracia (LND),
obteve uma vitória esmagadora, conseguindo 60%
dos assentos do parlamento. Suu Kyi foi a grande vencedora,
embora ainda estivesse cumprindo pena de prisão domiciliar. Em 1991, recebeu o Prêmio Nobel da Paz.
Entre 1989 e 2010,
Suu Kyi foi presa e libertada diversas vezes. Em uma das ocasiões em que esteve livre, teve permissão de ir à Inglaterra para reencontrar seu marido e seus dois filhos. Porém, temendo não ter permissão de entrar novamente em Mianmar, não aceitou. Seu marido, o Professor em Oxford Michael Aris, faleceu de câncer em 1999. A última vez que os dois se encontraram foi em 1995.
Em 13 de novembro de 2010, Suu Kyi foi libertada da prisão, em um processo de abertura política.
Em 13 de novembro de 2010
Em 2011, o governo militar foi dissolvido e o poder foi passado para um governo civil, que iniciou reformas políticas. Esse foi o primeiro passo para a atuação da oposição, o que permitiu Suu Kyi concorrer a uma vaga no parlamento. Nas eleições de abril de 2012, Suu Kyi foi eleita. Sua vitória causou
muita repercussão no mundo. Desde 1990, nenhum
representante do LND havia obtido uma vaga no parlamento.
Trata-se de um momento decisivo na política de Mianmar, que pode estar dando passos firmes rumo a uma forma de governo mais democrática.
Trata-se de um momento decisivo na política de Mianmar, que pode estar dando passos firmes rumo a uma forma de governo mais democrática.
Porém,
a luta ainda não cessou. Divergências sobre a Constituição aprovada em 2008
ainda geram graves estranhamentos entre governo e oposição. E, mesmo com reformas jurídicas, Suu Kyi manifesta ceticismo, pois, segundo ela, sem um judiciário independente, não haverá real justiça no país.
Além disso, nas últimas semanas, temos assistido a um recrudescimento da violência sectária no país, onde há constantes atritos entre a maioria budista e a minoria muçulmana. Tal conflito constitui-se como o maior desafio social para o novo governo.
Além disso, nas últimas semanas, temos assistido a um recrudescimento da violência sectária no país, onde há constantes atritos entre a maioria budista e a minoria muçulmana. Tal conflito constitui-se como o maior desafio social para o novo governo.
Devemos aguardar os próximos
meses para vermos os resultados das ações governamentais, tanto no que diz respeito às reformas democráticas, quanto em relação ao conflito entre budistas e muçulmanos.