Diariamente, somos bombardeados por informações vindas de todos os lados. Recebemos notícias, indicadores, análises, e prognósticos que chegam dos cinco continentes. Apesar da enormidade de informações, quase sempre nos vemos incapazes de compreender o que ocorre. Este blog pretende ser uma contribuição para entender esse mundo complexo. É claro, não tem a pretensão de ser um oráculo, que dê conta de tudo o que ocorre no mundo, mas uma busca incessante de entender o que acontece à nossa volta.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

O que está acontecendo em Mianmar?

Mianmar: : um novo começo?
Atualizada em 11 de junho de 2012

Eleições parlamentares em Mianmar, antiga Birmânia, possibilitaram que, pela primeira vez em 20 anos, um político de oposição assumisse um cargo legislativo no país, quando Aung San Suu Kyi foi eleita. Suu Kyi é a mais importante personalidade do país a lutar por reformas democráticas.
Porém, apesar da vitória eleitoral, os desafios continuam imensos. O país vive sob um regime militar desde 1962 e desde 1988 Mianmar está sob efetivo controle de uma junta militar, embora o país possua nominalmente um governo civil. Suu Kyi chegou a ameaçar não tomar posse caso a Constituição aprovada em 2008 não fosse revogada. A situação ainda permanece nebulosa e o mundo ainda observa os rumos políticos do país do Sudeste Asiático. Mas, afinal, o que acontece em Mianmar?
Para podemos compreender esse presente conturbado, é interessante observar a história do país.



O país hoje denominado Mianmar também é conhecido como Birmânia ou Burma e tem uma longa história. A primeira vez que a região foi unida se deu em 1044 D.C., quando uma dinastia conseguiu unir todas as etnias em um único reino e possibilitou uma grande efervescência cultural. Esse foi o período da entrada do Budismo na Birmânia e da construção dos monumentos budistas que até hoje atraem milhares de turistas anualmente ao país.
Após séculos de sucessivas alterações nas condições políticas – reino independente, parte do Império Mongol, lutas internas, mudanças dinásticas – a Birmânia caiu sob controle da Grã-Bretanha em 1885. Os britânicos começaram sua conquista em 1824 e após três guerras, conquistaram definitivamente o local e o anexaram à Índia Britânica.
Durante a Segunda Grande Guerra, um grupo de birmaneses, conhecidos como os “30 camaradas”, se juntou aos japoneses contra os britânicos. Porém, com o decorrer da guerra, mudaram de lado e apoiaram os Estados Unidos e a Grã-Bretanha.
Após a derrota do Japão, o General Aung Sun liderou um movimento que demandava a independência da Birmânia. Sem condições de manterem seu império na Ásia, os britânicos cederam. A Constituição da Birmânia foi elaborada e o país se tornou independente em 1948. Porém, Aung Sun e a maioria de seus apoiadores foram assassinados antes da Constituição entrar em vigor.
Entre 1948 e 1962, o país conheceu um governo democrático, parlamentar. Porém, as lutas políticas e étnicas internas eram ferozes, o que levou ao golpe militar em 1962, liderado pelo General Ne Win. Logo após a tomada do poder, o novo governo iniciou um projeto de construção de um regime de inspiração socialista na Birmânia.
Em 1988, a deterioração da situação econômica do país levou a imensas manifestações exigindo mudanças políticas. Milhares de estudantes, trabalhadores e monges budistas tomaram as ruas exigindo reformas democráticas. A resposta foi uma violenta repressão aos manifestantes. Diante da instabilidade, um grupo de generais depôs Ne Win, suspendeu a constituição, desmontou o sistema socialista construído pelo regime antecessor e mudou o nome do país para União de Mianmar. O novo governo foi violento na repressão das manifestações. Estatísticas indicam que cerca de 3.000 pessoas foram mortas pelas forças militares.
Entre 1988 e 2011, uma junta militar governou o país, embora ocorressem eleições regularmente. Em 2008 foi aprovada a Constituição ainda em vigor no país, que concede amplos poderes aos militares. Prevê que seja reservado um quarto dos assentos do parlamento aos militares e que três ministérios chave – Interior, Defesa e Assuntos de Fronteiras – sejam ocupados por Generais da ativa.
Dentre os opositores do regime instalado em 1988, destacou-se a ativista Aung San Suu Kyi.




Suu Kyi, filha do General e herói da independência Aung Sun, nasceu em 1945. Após morar um tempo com a mãe na Índia, se mudou para a Inglaterra. Estudou filosofia, economia e ciência política na Universidade de Oxford. Suu Kyi residiu na Inglaterra até 1988, quando retornou à sua terra natal.
Suu Kyi retornou à Birmânia em meio às turbulências políticas de 1988 e se juntou aos protestos contra o Presidente Ne Win e liderou comícios por todo o país, inspirada pelas táticas de Martin Luther King e Mahatma Ghandi. Quando a junta militar derrubou Ne Win, Suu Kyi se manteve na vanguarda da luta por reformas democráticas. Como resultado, foi posta em prisão domiciliar em 1989.
Em 1990, o governo militar convocou eleições. Esperando uma esmagadora vitória, os novos governantes não adotaram medidas para tentar controlar o resultado das eleições. Com isso, o partido liderado por Suu Kyi, a Liga Nacional pela Democracia (LND), obteve uma vitória esmagadora, conseguindo 60% dos assentos do parlamento. Suu Kyi foi a grande vencedora, embora ainda estivesse cumprindo pena de prisão domiciliar. Em 1991, recebeu o Prêmio Nobel da Paz.
Entre 1989 e 2010, Suu Kyi foi presa e libertada diversas vezes. Em uma das ocasiões em que esteve livre, teve permissão de ir à Inglaterra para reencontrar seu marido e seus dois filhos. Porém, temendo não ter permissão de entrar novamente em Mianmar, não aceitou. Seu marido, o Professor em Oxford  Michael Aris, faleceu de câncer em 1999. A última vez que os dois se encontraram foi em 1995.
Em 13 de novembro de 2010, Suu Kyi foi libertada da prisão, em um processo de abertura política.
Em 2011, o governo militar foi dissolvido e o poder foi passado para um governo civil, que iniciou reformas políticas. Esse foi o primeiro passo para a atuação da oposição, o que permitiu Suu Kyi concorrer a uma vaga no parlamento. Nas eleições de abril de 2012, Suu Kyi foi eleita. Sua vitória causou muita repercussão no mundo. Desde 1990, nenhum representante do LND havia obtido uma vaga no parlamento.

Trata-se de um momento decisivo na política de Mianmar, que pode estar dando passos firmes rumo a uma forma de governo mais democrática.
Porém, a luta ainda não cessou. Divergências sobre a Constituição aprovada em 2008 ainda geram graves estranhamentos entre governo e oposição. E, mesmo com reformas jurídicas, Suu Kyi manifesta ceticismo, pois, segundo ela, sem um judiciário independente, não haverá real justiça no país.
Além disso, nas últimas semanas, temos assistido a um recrudescimento da violência sectária no país, onde há constantes atritos entre a maioria budista e a minoria muçulmana. Tal conflito constitui-se como o maior desafio social para o novo governo.
Devemos aguardar os próximos meses para vermos os resultados das ações governamentais, tanto no que diz respeito às reformas democráticas, quanto em relação ao conflito entre budistas e muçulmanos.

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