Diariamente, somos bombardeados por informações vindas de todos os lados. Recebemos notícias, indicadores, análises, e prognósticos que chegam dos cinco continentes. Apesar da enormidade de informações, quase sempre nos vemos incapazes de compreender o que ocorre. Este blog pretende ser uma contribuição para entender esse mundo complexo. É claro, não tem a pretensão de ser um oráculo, que dê conta de tudo o que ocorre no mundo, mas uma busca incessante de entender o que acontece à nossa volta.

domingo, 9 de junho de 2013

O que está acontecendo na Turquia?

Atualizado em 17 de junho de 2013

Nas últimas semanas, a Turquia vem passando por intensos combates de rua entre manifestantes e forças do governo. Protestos que se iniciaram em Istambul se espalharam para dezenas de cidades do país, quatro pessoas morreram, outras centenas ficaram feridas e milhares foram presas. Trata-se de um fenômeno inaudito em um país que tem se mantido relativamente estável nos últimos anos e que parecia estar incólume às revoltas que eclodem no Oriente Médio e no Norte da África desde o fim de 2010. Mas, afinal, o que está acontecendo na Turquia?



Embora tenha atraído a atenção da mídia há poucos dias, as manifestações de rua se iniciaram em 1º de maio de 2013, quando um grupo de jovens tentava evitar que o governo derrubasse árvores no Parque Gezi, em Istambul. O projeto do governo é remover o parque para dar lugar a um prédio que irá abrigar um shopping center. Muitos turcos se mostraram contrários ao projeto, afirmando que o parque é uma das poucas áreas verdes remanescentes da cidade. Os manifestantes se mostraram indignados pelo fato de uma área pública ser destruída para dar lugar a um empreendimento comercial privado.
No final de maio, os protestos se intensificaram. No dia 28, cerca de 100 jovens fizeram uma manifestação pacífica, se posicionando no parque para evitar que as máquinas dessem início ao trabalho. No dia 30, o governo enviou a polícia para dispersar o grupo. As forças policiais fizeram uso de gás lacrimogêneo e canhões de água e foi acusada de uso excessivo da força. Rapidamente, os manifestantes pediram auxílio pelas redes sociais na Internet e logo chegaram centenas de pessoas à Praça Taksim, ao lado do parque, local que se tornou o centro das manifestações. A partir de então, os confrontos se espalharam para outras cidades, como a capital, Ankara, e as cidades Izmir e Adana.
Apesar do estopim para as manifestações ter sido a destruição do parque, a extensão dos protestos, assim como a violência desencadeada com a tentativa da polícia em dispersar os manifestantes, indicam que algo mais profundo está por trás desse fenômeno.
Os manifestantes crescentemente vêm fazendo duras críticas ao governo do Primeiro Ministro Recep Tayyip Erdogan (lê-se "er-do-wan"). Eles alegam que Erdogan está se tornando cada vez mais autoritário, não levando em consideração a vontade da população em diversos projetos. Vale dizer que uma rua importante próxima ao Parque Gezi foi totalmente alterada nos últimos anos, onde prédios antigos foram derrubados para dar lugar a casas luxuosas e caros centros comerciais. Além disso, Erdogan é acusado de querer "islamizar" o país, ao aprovar leis que contrariam os costumes seculares de grande parte da população turca, como a que proíbe a publicidade de bebidas alcoólicas e limita o horário de funcionamento de lojas que vendem bebidas até às 22h. Essa lei foi aprovada no final de maio de 2013.
Uma das demandas dos manifestantes é a convocação de novas eleições, o que foi prontamente rejeitado pelo governo.
Erodgan está no poder desde 2003, pelo Partido da Justiça e do Desenvolvimento, um grupo com orientações islamistas. Foi reeleito em 2011, porém com uma votação pouco acima dos 50%. Muitos daqueles que votaram no partido de Erdogan anteriormente, especialmente por causa de sua política econômica, ultimamente têm escolhidos outros partidos, afirmando que Erdogan tem se tornado cada vez mais autoritário e se aproximado de grupos muçulmanos conservadores.
O Primeiro Ministro recusa totalmente a ideia de que esteja ocorrendo uma "Primavera Turca" e acusa os partidos de oposição de estarem incitando as pessoas aos protestos para obterem ganhos políticos. Com efeito, muitos grupos de esquerda e nacionalistas se juntaram aos protestos, mas as manifestações tiveram início entre jovens ativistas, agindo individualmente, e grupos secularistas não necessariamente ligados a algum partido político.
A Turquia é apresentada internacionalmente como um experimento de sucesso de secularismo no Oriente Médio. Porém, os recentes acontecimentos no país têm despertado preocupação entre os parceiros internacionais. O Presidente norte-americano Barack Obama criticou as ações do governo como excesso de força. Tal declaração é de suma importância, pois os Estados Unidos são os principais aliados da Turquia. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial,  Washington tem um interesse especial no país. Durante a Guerra Fria, a proximidade se dava em função do perigo soviético. A Turquia é integrante da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Agora, nesse início de século XXI, os Estados Unidos veem na Turquia um estabilizador do Oriente Médio e um parceiro na luta contra o terrorismo. 

O Primeiro Ministro demandou fortemente que os protestos cessassem e que a ordem fosse restabelecida. Para isso, mandou as forças de segurança para dispersar as multidões nas ruas. Erdogan reuniu-se com manifestantes para ouvir duas reivindicações. No entanto, o acordo não foi obtido e, em 15 de junho, o Primeiro Ministro deu uma ordem para a polícia "limpar" a Praça Taksim (ocupada pelos manifestantes havia duas semanas). A confrontação foi grave, houve várias pessoas feridas e presas. No dia seguinte, Erdogan foi aclamado por uma multidão de apoiadores. Em comunicado ao país, solicitou que os manifestantes não voltassem à praça.
Contudo, as manifestações têm continuado. Resta saber quem, no fim das contas, irá vencer essa queda de braço ou se algum tipo de compromisso será alcançado entre as partes.

Um comentário:

  1. Excelente explicação!
    Acredito sim, que esta seja a Primavera Turca.

    Adorei o Blog!

    Anne Caroline - Minas Gerais

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